23.7.08

Reflexões

Qualquer pessoa minimamente atenta à comunicação social, e que seja dotada de uma perspectiva critica, não pode deixar de reparar como o panorama do jornalismo nacional é, na grande maioria dos casos, desolador.

Muitos dos principios básicos do que é fazer jornalismo perderam-se. Os próprios jornalistas parecem sujeitos à vertigem do tempo que eles próprios ajudam a criar, ou que o mundo mediático cria. Já não se pensa, não se pára para pensar. Assume-se e aceita-se tudo, ou quase tudo.

Isto tem várias causas. Desde logo a velha questão dos orgãos de comunicação social serem também eles empresas, e de, tal como todas as outras empresas, estarem sujeitos à lógica economicista. É preferível ter redacções no limite dos minimos e pagar misérias a estagiários que façam alguma coisa do que gastar dinheiro e recursos e investir em pessoas que façam bom jornalismo.

A segunda questão é consequência natural da primeira. A nova geração de jornalistas já não tem qualquer ideal. Hoje já não se luta por nada. Não se luta pela verdade, não se luta pela justiça, não se luta pela liberdade. De resto nem se pode perder tempo com isso, porque a única coisa com que se pode verdadeiramente gastar recursos a lutar é pelo próprio emprego. Pode ser mal pago, mas tem-se um emprego e muitos outros não têm. E se se contestar muito não é dificil arranjar alguém para a mesma posição. Como é possivel lutar por alguma coisa mais além numa sociedade quando em causa, no limite, está a própria sobrevivência de uma pessoa?

Não auguro nada de bom para o futuro do jornalismo neste contexto. É claro que há, e sempre haverá, excepções que são de louvar. Mas o jornalismo e os jornalistas caminham perigosamente para uma massa amorfa de pessoas, seguidistas e acriticas, que não sabem fazer aquilo que deveriam fazer em primeiro lugar: saber questionar.

4 comentários:

zeca disse...

Uma óptima reflexão no meio genérico da comunicação social em Portugal.
Ainda assim, creio haver espaço para livremente se trabalhar. Há por isso um género jornalístico ímpar: a reportagem. A par dos factos, há sempre algo mais que transparece, e esse algo mais tem necessáriamente a ver com quem pensa faz e escreve ou diz.

Mas concordo contigo sobretudo quando escreves que é dificil lutar por algo mais, quando a luta pela sobrevivência leva quase todos os recursos.

Bela posta JD.

teresa disse...

concordo contigo, jd.

às vezes acho incrível como é que os jornalistas têm de estar sujeitos a certas condições quando deveriam ser eles os primeiros a denunciar as irregularidades e a lutar pelos seus direitos..

mas, como dizes, é difícil escapar à loja economicista: afinal, o que fazemos só tem sentido se houver alguém do outro lado.

no meio disto tudo, não consigo ver uma solução para o problema. às vezes parece que é uma questão de "sorte" o estarmos a trabalhar na área. "calhou" termos estágio num certo sítio, "calhou" esse sítio precisar de alguém, "calhou" e lá ficámos..

pode ser que "calhe" e que os melhores acabem por ficar.

João Santos Duarte disse...

Concordo contigo nessa perspectiva Zeca. A reportagem é de facto esse espaço para livremente se trabalhar. Nesse sentido é de louvar a recente aposta das televisões, que de novo se parecem terem virado para esse género( provavelmente por efeito mimético, porque as televisões copiam-se umas às outras).Mas de facto há que reconhecer que têm feito coisas interessantes.

Mas lá está, as televisões podem fazer isso porque têm mais recursos. Em outros orgãos de comunicação social a reportagem é neglicenciada porque representa muitas vezes um investimento que é considerado incomportável. E porque os jornalistas estão demasiado ocupados com o trabalho do dia a dia na redacção, com o telex que chega e com a reacção ao telex. Lá está, voltamos à mesma questão : isso acontece porque as redacções estão nos minimos,e não se pode libertar jornalistas para outro tipo de trabalho quando se tem de assegurar os serviços minimos.


Quanto ao que diz a Teresa, quem pertence a esta nova

João Santos Duarte disse...

Quanto ao que diz a Teresa, quem pertence a esta nova geração de jornalistas percebe bem essa expressão "calhou".

Hoje já não basta ter valor e empenho, é preciso de facto estar no sitio certo no momento certo.
Ou em outros casos ter conhecimentos, como acontece em tantas outras áreas.
Como bem sabemos,nem sempre os melhores acabam por ficar...

E hoje é notório que há muita gente burra no jornalismo, é preciso dize-lo sem meias palavras. Até me contorço todo com determinadas perguntas que pseudo-jornalistas fazem na televisão ou em conferências de imprensa ...